O Brasil continua vivendo sob a égide
dos Atos Institucionais do regime militar. Os comunistas estão divididos entre
várias tendências. Os Festivais de Música Popular servem de palco para protestos
traduzidos em canções, e a televisão cria programas com forte apelo para
difundir modismos entre os jovens, numa clara tentativa de desviar sua atenção
dos problemas nacionais. Carlos Lacerda, Juscelino e João Goulart, em companhia
de outros oposicionistas ao governo, fazem parte agora da Frente Ampla,
movimento destinado a lutar contra a ditadura, cujas reuniões se dão no
exterior.
Os militares conseguiram uma façanha
insólita: reaproximar e reunir os opostos.
Não há como evitar as escaramuças entre
estudantes que protestam e as polícias militares e o exército, tantas vezes levado
às ruas para exercer a repressão. Exército que deveria nos defender dos
agressores de nossa pátria. Os quartéis se transformaram em prisões e algumas
de suas acomodações são câmaras de tortura e morte, fortemente resguardadas do
povo e da imprensa, esta calada pela censura que lhe é imposta.
A União Nacional de Estudantes ganha
dimensão não planejada, reflexo da luta em que estão engajados seus
participantes, muitos mortos na rua ou desaparecidos. Toda uma geração chega à
maturidade dividida entre os que tentam pensar - e sofrem por isso - e os que
se mantém à margem dos acontecimentos.
No Vietname, soldados americanos,
sofrendo constantes revezes e protagonizando dantescas cenas de covardia,
mantém uma luta sem perspectiva. Pesa a intransigência dos donos do poder
mundial, tentando manipular a seu modo os destinos de povos distintos.
O radicalismo mostra as garras. Martin
Luther King, líder pacifista negro, é assassinado nos Estados Unidos, o que se
repete pouco depois, levando Robert Kennedy, então candidato à presidência do
país.
O Comando de Caça aos Comunistas,
formado por extremistas de direita, na verdade assassinos comuns disfarçados
sob uma sigla, e com a cumplicidade das autoridades, espalha terror em diversas
cidades brasileiras. O povo mais simples e menos informado se confunde com a
divulgação dos fatos.
A Europa ferve. Na França, estudantes e
trabalhadores param o país clamando por mudanças e obrigando De Gaulle a
compor-se com conservadores e negociar o apoio do exército a seu governo. Oliveira
Salazar, um dos mais antigos ditadores, abandona o governo em Portugal. Sua saúde
decadente conseguiu o que o país tentou por décadas sem sucesso. Na
Tchecoslováquia, os soviéticos esmagam a Primavera de Praga, movimento liderado
por Dubcek, Primeiro-Secretário do Partido Comunista de seu país, que dava
início a modificações na vida política e econômica.
As garras do totalitarismo não tem
bandeira preferencial. As contradições de todo regime de força são nítidas. Nas
guerras, impostas com o pretexto de proteger direitos, idéias ou regimes,
países são devastados, gerações são aniquiladas, a natureza destruída, a
cultura esquecida e a liberdade manipulada. Nas ditaduras, mesmo não imperando
uma guerra declarada, o pensamento é amordaçado, os questionamentos ocultados,
as notícias elaboradas de acordo com as conveniências e os direitos
redefinidos, na dimensão do considerado permitido. E o direito mais primordial
de um povo, qual seja o de poder criar seus líderes, é anulado pela voracidade
com que as forças do poder saem à cata de suas sombras.
Engana-se o carrasco, quando executa
quem luta por idéias. Eliminou uma arma, esqueceu da munição. O ideal, o sonho
de liberdade, a luta pelo direito de trilhar seu caminho, nasce com cada um,
mas está além de suas dimensões, ficando nos outros e na história, mesmo após
sua morte. É esta munição, volátil e concreta, que atravessa o tempo e perdura
para sempre. Porque não está no sangue que pode ser derramado. Mas fica na
atitude, no exemplo que não se esquece, na coragem da palavra que vaga em
ondas, distribuída e captada por novas gerações.
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